Em
matéria penal, a Justiça Eleitoral só julga crimes eleitorais.
Mesmo que haja crime conexo, o julgamento será desmembrado, já que
a competência da Justiça Eleitoral é definida na Constituição e
a regra de conexão é infraconstitucional.
Note
que, no entanto, crimes eleitorais podem ser julgados por
tribunais que não fazem parte da estrutura da Justiça Eleitoral:
são os casos de competência por prerrogativa de foro, onde os
acusados/investigados são detentores de cargos que atraem a
competência do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de
Justiça.
Em
um inquérito que apurava a ocorrência de crime eleitoral, o
Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, traçou
interessante resumo dos entendimentos daquela corte acerca dos
efeitos do arquivamento do processo criminal.
Em
resumo:
- Se o pedido de arquivamento se funda na extinção da punibilidade, o juiz deve proferir decisão a respeito, para declará-la ou para denegá-la, caso em que o julgado vinculará a acusação. Há, nesse caso, julgamento definitivo e formação de coisa julgada material;
- Se o pedido de arquivamento ocorre por atipicidade da conduta,o juiz deve decidir a respeito e, colhendo o fundamento do pedido, a decisão tem a mesma eficácia de coisa julgada da rejeição da denúncia por motivo idêntico, impedindo denúncia posterior com base na imputação que se reputou não criminosa;
- Se o arquivamento é requerido por falta de base empírica, com base nas provas até então existentes para o oferecimento da denúncia, o juiz pode submeter o caso ao Procurador-Geral da República, que, no entanto, se insistir nele, fará o arquivamento irrecusável, decisão que não forma coisa julgada material.
Nesse
último caso, o fundamento é o art. 28 do Código de Processo Penal
(“Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar
a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de
quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar
improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou
peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a
denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para
oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só
então estará o juiz obrigado a atender.”).
Nos
processos criminais de competência originária do STF, como já é o
próprio Procurador-Geral quem requer o arquivamento, ao relator não
restará alternativa que não o deferimento do pedido, por decisão
de efeitos rebus sic stantibus, que apenas impede, sem provas
novas, o oferecimento da denúncia.
Assim,
apenas nas hipóteses de atipicidade da conduta e de extinção da
punibilidade poderá o STF analisar o mérito das alegações do
pedido de arquivamento.
Veja
a decisão mencionada, que foi publicada no Diário de Justiça
Eletrônico do STF n.º 43, de 01.03.12:
Inq/3096 - INQUÉRITO
Relator: MIN. GILMAR MENDESMatéria: DIREITO PENAL | Crimes Previstos na Legislação Extravagante | Crimes Eleitorais | Captação ilícita de votos ou corrupção eleitoralDespacho: Cuida-se de inquérito policial instaurado para apurar a possível prática do delito previsto no art. 299 do Código Eleitoral pelo Deputado Federal [...], pelo Deputado Estadual […] e por [...], em razão da distribuição de bens no Município de Forquetinha/RS com a finalidade de obter votos para os dois primeiros investigados.Após a juntada de informações pela autoridade policial (fls. 65-91), os autos foram encaminhados à Procuradoria-Geral da República.Em manifestação subscrita pela Subprocuradora-Geral, Cláudia Sampaio Marques, e aprovada pelo Procurador-Geral da República, foi requerido o arquivamento dos autos “em razão da inexistência de um conjunto indiciário mínimo para justificar o prosseguimento das investigações” (fls. 94-98).É o breve relatório. Passo a decidir.Na hipótese de existência de pronunciamento do Chefe do Ministério Público Federal pelo arquivamento do inquérito, tem-se, em princípio, um juízo negativo acerca da necessidade de apuração da prática delitiva exercida pelo órgão que, de modo legítimo e exclusivo, detém a opinio delicti a partir da qual é possível, ou não, instrumentalizar a persecução criminal.A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal assevera que o pronunciamento de arquivamento, em regra, deve ser acolhido sem que se questione ou se entre no mérito da avaliação deduzida pelo titular da ação penal (cf., nesse sentido, as seguintes decisões: INQ nº 510/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Plenário, unânime, DJ 19.4.1991; INQ nº 719/AC, Rel. Min. Sydney Sanches, Plenário, unânime, DJ 24.9.1993; INQ nº 851/SP, Rel. Min. Néri da Silveira, Plenário, unânime, DJ 6.6.1997; HC nº 75.907/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, maioria, DJ 9.4.1999; HC nº 80.560/GO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, unânime, DJ 30.3.2001; INQ nº 1.538/PR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Plenário, unânime, DJ 14.9.2001; HC nº 80.263/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Plenário, unânime, DJ 27.6.2003; INQ nº 1.608/PA, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, unânime, DJ 6.8.2004; INQ nº 1.884/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, maioria, DJ 27.8.2004; INQ (QO) nº 2.044/SC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Plenário, maioria, DJ 8.4.2005; e HC nº 83.343/SP, 1ª Turma, unânime, DJ 19.8.2005).Esses julgados ressalvam, contudo, duas hipóteses em que a determinação judicial do arquivamento possa gerar coisa julgada material, a saber: prescrição da pretensão punitiva e atipicidade da conduta.Nesse particular, é válido transcrever o inteiro teor da ementa do Inquérito nº 1.604/AL, da relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence, que expõe essa questão com clareza:Inquérito policial: arquivamento requerido pelo chefe do Ministério Público por falta de base empírica para a denúncia: irrecusabilidade. 1. No processo penal brasileiro, o motivo do pedido de arquivamento do inquérito policial condiciona o poder decisório do juiz, a quem couber determiná-lo, e a eficácia do provimento que exarar. 2. Se o pedido do Ministério Público se funda na extinção da punibilidade, há de o juiz proferir decisão a respeito, para declará-la ou para denegá-la, caso em que o julgado vinculará a acusação: há, então, julgamento definitivo. 3. Do mesmo modo, se o pedido de arquivamento - conforme a arguta distinção de Bento de Faria, acolhida por Frederico Marques , traduz, na verdade, recusa de promover a ação penal, por entender que o fato, embora apurado, não constitui crime, há de o Juiz decidir a respeito e, se acolhe o fundamento do pedido, a decisão tem a mesma eficácia de coisa julgada da rejeição da denúncia por motivo idêntico (C.Pr.Pen., art. 43, I), impedindo denúncia posterior com base na imputação que se reputou não criminosa. 4. Diversamente ocorre se o arquivamento é requerido por falta de base empírica, no estado do inquérito, para o oferecimento da denúncia, de cuja suficiência é o Ministério Público o árbitro exclusivo. 5. Nessa hipótese, se o arquivamento é requerido por outro órgão do Ministério Público, o juiz, conforme o art. 28 C. Pr. Pen., pode submeter o caso ao chefe da instituição, o Procurador-Geral, que, no entanto, se insistir nele, fará o arquivamento irrecusável. 6. Por isso, se é o Procurador-Geral mesmo que requer o arquivamento como é atribuição sua nas hipóteses de competência originária do Supremo Tribunal a esse não restará alternativa que não o seu deferimento, por decisão de efeitos rebus sic stantibus , que apenas impede, sem provas novas, o oferecimento da denúncia (C.Pr.Pen., art. 18; Súmula 524). 7. O mesmo é de concluir, se qual sucede no caso , o Procurador-Geral, subscrevendo-o, aprova de antemão o pedido de arquivamento apresentado por outro órgão do Ministério Público (INQ nº 1.604/AL, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, unânime, DJ 13.12.2002).Constata-se, portanto, que apenas nas hipóteses de atipicidade da conduta e de extinção da punibilidade poderá o Tribunal analisar o mérito das alegações trazidas pelo Procurador-Geral da República.Isso evidencia que, nas demais hipóteses, como nada mais resta ao Tribunal a não ser o arquivamento do inquérito, a manifestação do Procurador-Geral da República, uma vez emitida, já seria definitiva no sentido do seu arquivamento.Ante o exposto, na linha da orientação desta Corte, com fundamento no art. 3º, I, da Lei nº 8.038/90 e art. 21, XV, do RISTF, acolho a manifestação do Ministério Público Federal e determino o arquivamento do presente inquérito.Publique-se.Brasília, 27 de fevereiro de 2012.
Ministro Gilmar MendesRelator
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