Uma
modalidade de cláusula de barreira foi instituída pela Emenda
Constitucional nº 97/2017, que também criou nova hipótese constitucional de justa causa para desfiliação partidária - o não
preenchimento pelo partido dos requisitos do § 3º do art. 17 da
Constituição.
O
Tribunal Superior Eleitoral, respondendo a consulta formulada pelo
partido Democracia Cristã (DC), decidiu que o resultado das Eleições
2018 para a composição da Câmara dos Deputados deverá ser
considerado para aplicação da cláusula de barreira na legislatura
de 2019 a 2022 (Consulta nº 0604127-30.2017.6.00.0000).
Da
mesma forma, a corte fixou que os partidos políticos que não
atingiram os requisitos nas eleições de 2018 ficarão
impossibilitados de receber recursos do Fundo Partidário a partir de
1° de fevereiro de 2019. Ainda
no
julgamento da PET nº 0601892-56, o relator da decisão, Min. Tarcísio Vieira
de Carvalho Neto, apresentou
“uma
minuta de portaria com as tabelas das legendas que cumpriram e das
que não cumpriram as regras da cláusula de barreira. “Sendo certo
que essas tabelas podem sofrer eventuais alterações decorrentes de
totalizações derivadas de julgamentos de registros ainda
pendentes””.
Fixado
pelo Tribunal Superior Eleitoral que a regra de transição da emenda
constitucional passa a produzir efeitos (impedimento de repasse de
recursos do Fundo Partidário ao partido que não tenham cumprido os
requisitos fixados na norma) a partir de 1° de fevereiro de 2019, é
de se questionar acerca da aplicação da permissão para mudança de
partido.
ATUALIZAÇÃO: divulgada a relação de partidos políticos que não atingiram a composição e distribuição do percentual mínimo de votos ou não elegeram bancada mínima para a Câmara dos Deputados fixados pelas alíneas a e b do inciso I do art. 3º da EC nº 97/2017
ATUALIZAÇÃO: divulgada a relação de partidos políticos que não atingiram a composição e distribuição do percentual mínimo de votos ou não elegeram bancada mínima para a Câmara dos Deputados fixados pelas alíneas a e b do inciso I do art. 3º da EC nº 97/2017
Quando
da apreciação da proposta de emenda constitucional, os pareceres
produzidos na Câmara dos Deputados
mencionaram a necessidade de consolidação do quadro partidário
brasileiro:
Em
relação à cláusula de desempenho, afirmam os autores que tal
mecanismo torna-se fundamental para a consolidação do quadro
partidário brasileiro, hoje bastante disperso. Ademais, sustentam
que a pulverização de partidos políticos no Congresso Nacional,
sem que novas medidas de fortalecimento da identidade e fidelidade
partidárias tenham sido eficazmente implementadas, cria dificuldades
para o funcionamento do Poder Legislativo e contribui para um maior
distanciamento entre a população e seus representantes.
O
significativo número de partidos políticos no Brasil foi associado
às facilidades de acesso dos partidos políticos aos recursos do
fundo partidário e ao tempo de propaganda gratuito no rádio e na
televisão e a redução do número de legendas, à redução dos
custos políticos de governabilidade. Vejamos:
É
esse o desafio enfrentado por esta Comissão e por todas as outras
que a antecederam. Nesse esforço coletivo, no qual contamos com a
contribuição preciosa de diversas autoridades políticas e
especialistas da área, identificamos que o grande número de
partidos com representação no Congresso Nacional está diretamente
relacionado com duas distorções institucionais em nosso ordenamento
político-eleitoral. Essas distorções são: 1) a possibilidade de
coligações eleitorais; 2) as regras de acesso dos partidos
políticos aos recursos do fundo partidário e ao tempo de propaganda
gratuito no rádio e na televisão.
[...]
[...]
De
outro, estou convicta de que essas inovações promoverão uma
importante redução da quantidade excessiva de partidos políticos
com representação no Congresso Nacional, o que contribuirá
decisivamente para a redução dos elevadíssimos custos políticos
de governabilidade e, consequentemente, para uma maior estabilidade
do sistema político brasileiro.
[...]
Essa
norma está alinhada com o nosso modelo de democracia representativa,
em que os representantes são recrutados e apresentados à sociedade
por meio dos partidos políticos e não individualmente. Esse modelo,
contudo, tem sido deturpado pela excessiva migração partidária que
tem acompanhado a realidade legislativa nas últimas décadas. Entre
1986 e 2010, por exemplo, nada menos que 27% dos Deputados Federais
trocaram de partido ao longo do exercício do mandato (NICOLAU, 2017,
p. 80).
Todos
nós sabemos os efeitos negativos que a liberdade plena de migração
partidária durante o exercício dos mandatos tem causado às nossas
instituições representativas. Na prática, a desfiliação
partidária injustificada reduz a importância das ideias e programas
partidários durante as legislaturas. E, consequentemente, compromete
a governabilidade política, na medida em que retira a estabilidade
de acordos e negociações de agendas políticas que normalmente são
realizadas com base na composição das forças
partidárias
representadas no Legislativo.
representadas no Legislativo.
Contraditoriamente,
a norma que implicará na redução do número de partidos políticos
criou nova possibilidade de migração partidária.
Tal
circunstância foi inclusive apontada no voto em separado
produzido por membros daquela casa:
A
ideia de ataque ao direito das minorias ganha ainda mais força
quando extraímos da PEC a possibilidade que os mandatos eleitos têm
de mudar de partido sem incorrer na perda de mandato pela via da
infidelidade partidária. Ora, se a ideia é enfrentar apenas o
fisiologismo, porque não assegurar a fidelidade partidária
inclusive para esses casos? Questões estruturais não devem pautar a
alocação partidária de parlamentares. O elemento central da
discussão deve ser a identidade ideológica, garantindo, acima de
tudo, a igualdade entre os mandatos.
Considerando
que a cláusula de barreira produzirá efeitos a partir de
01.02.2019, é possível defender que os mandatários prejudicados
pelos seus efeitos possam se valer da possibilidade de justa causa
para desfiliação tendo a mesma data como termo.
Da
mesma forma, considerando que as restrições aos partidos ditos
pequenos - aqueles que não atingiram a cláusula de barreira -
atingirão imediatamente os partidos em todas as esferas, é razoável
que a justificativa para desfiliação seja estendida aos eleitos nas
Eleições 2016 que ocupam atualmente cargos de vereador.
O
efeito imediato da cláusula de barreira é o fim do repasse dos
recursos do Fundo Partidário e o mediato é a vedação de acesso à
propaganda em rádio e TV.
Mesmo
que integralidade das restrições impostas aos partidos pequenos
somente esteja configurada com o início da campanha eleitoral de
2020, a negação do direito de migração dos vereadores a partir do
fim do acesso aos recursos do Fundo Partidário faria do § 5º do
art. 17 da Constituição letra morta, visto que a desfiliação no
ano da eleição é hipótese de justa causa já prevista no item III
do art. 22-A da Lei nº 9.096/1995.
Sobre
o tema:
A
hipótese de justa causa prevista no item III do art. 22-A da Lei nº
9.096/1995 passou a ser apelidada de “janela para troca de
partido”, por oportunizar a troca de partido sem uma causa
específica a não ser a proximidade de outras eleições associadas
ao fim do mandato. A questão foi inclusive tratada também pela EC
nº 91/2016. Sem alterar explicitamente o texto constitucional, a
emenda facultou ao detentor de mandato eletivo desligar-se do partido
pelo qual foi eleito nos trinta dias seguintes à sua promulgação,
sem prejuízo do mandato. Percebe-se o caráter episódico da emenda,
diante da vinculação do prazo para desfiliação a dias corridos
após a promulgação da emenda. O texto, além disso, foi mais
abrangente que o da Lei nº 9.096/1995, com a redação dada pela Lei
nº 13.165/2015, uma vez que o art. 22-A, III, da Lei nº 9.096/1995
admite a mudança de partido sem perda de mandato, apenas para aquele
que estiver ao término no mandato vigente. Vê-se que parece ser
difícil consolidar a fidelidade partidária na prática política
brasileira, impedindo que os eleitores identifiquem, via partido, o
perfil de seus candidatos.
A
EC nº 97/2017 introduziu uma nova hipótese de justa causa para a
desfiliação no art. 17 da CF/1988. Trata-se da desfiliação de
partido que não conseguir superar a cláusula de barreira também
introduzida no texto constitucional pela mesma emenda (art. 17, §
5º, da CF/1988). A norma é compreensível já que o candidato,
nessa situação, estará integrando um partido sem tanta
representatividade, e com limitação ao acesso das verbas do fundo
partidário, e à televisão, ou seja, com limitação de desempenho
e funcionamento.
(Machado,
Raquel Cavalcanti Ramos. Direito eleitoral – 2. ed. rev., atual. e
ampl. – São Paulo: Atlas, 2018)
Assim,
para que haja diferenciação entre as hipóteses da janela para
troca de partido em razão da proximidade da eleição (art. 22-A, inc. III, da Lei nº 9.096/95) e da nova
justa causa constitucional (art. 17, § 5º, da CF), é necessário que se reconheça que a
segunda deva ser admitida a partir da divulgação, pelo órgão
competente, da relação de partidos que não atingiram a cláusula de barreira.
No
entanto, para evitar a insegurança jurídica, o Tribunal Superior
Eleitoral poderia cogitar da fixação de prazo para migração
partidária, a fim de evitar as negociações pouco republicanas
inerentes à possibilidade de troca de partido a qualquer tempo.
Esse
posicionamento inclusive foi adotado pela corte ao responder a
Consulta nº 755-35 em relação à criação de partido novo.
Naquela
ocasião, foi fixado que o prazo razoável para a filiação no novo
partido é de 30 dias contados do registro do estatuto partidário
pelo TSE.
Da
mesma forma, o Tribunal poderia, ao publicar a portaria com as
tabelas das legendas que cumpriram e das que não cumpriram as regras
da cláusula de barreira, dar ciência aos interessados da abertura
do prazo para a migração partidária e da data final para
manifestação da opção.
Certamente
tal procedimento evitaria que várias ações sejam levadas aos
Tribunais Eleitorais questionando a possibilidade de desfiliação e
o prazo para optar pela troca de partido.
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Apenas para permitir a continuidade da discussão, eh importante considerar que o "tamanho" do partido implica na participação nas comissões das casas legislativas e na mesa diretora.
ResponderExcluirEntão, por exemplo na hipótese de deputados eleitos não empossados migrarem para a agremiação que alcançou a cláusula de desempenho, fará com que o cálculo de proporcionalidade e representatividade nas assembleias e câmaras seja de uma forma.
E, caso a possibilidade para mudança de partido, seja somente após a posse (01 de fev de 19) a proporcionalidade dessa divisão será outra totalmente diferente. Pois a eleição da mesa diretora e sua composição, formação da blocos parlamentares etc . . . Ficará comprometida .
Excelente análise! Obrigada pela participação.
ResponderExcluirDa mesma forma que o “tamanho dos partidos”, é perceptível que o legislador se preocupou em contornar as máculas apontadas pelo Supremo Tribunal Federal quando da declaração de inconstitucionalidade da cláusula de barreira prevista no art. 13 da Lei nº 9.096/95, em especial a questão do funcionamento parlamentar. A redação original do projeto de emenda constitucional (PEC 282/2016) previa expressamente a perda do direito de funcionamento parlamentar, mas todos os dispositivos que estabeleciam essa restrição não constaram na redação final da norma.
É possível deduzir daí que a restrição do funcionamento parlamentar tenderia a atrair a inconstitucionalidade da emenda.
No entanto, essa restrição foi trazida em Resolução da Câmara dos Deputados, que já está sendo questionada no STF (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=400380).
Certamente esse é um aspecto da questão que deve ser considerado pelo Tribunal Superior Eleitoral, tanto em relação ao funcionamento parlamentar quanto à participação nas comissões e mesa diretora.
Me parece que a migração partidária não é viável antes da divulgação oficial pelo TSE da nominata das agremiações que não atingiram a cláusula de barreira, já que o prejuízo que legitima a desfiliação somente começa a ser experimentado com a supressão do recebimento dos recursos do Fundo Partidário.
Mas certamente essa é uma alteração em nosso sistema que terá muitos desdobramentos.
Concordo !!
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